terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

A bela magoada - Final

Para entender: A bela Magoada, parte 1.

Cláudia estava espantada. Aquela lembrança que havia surgido subitamente em sua mente, trouxe uma avalanche de sentimentos. Ela não conseguia mas tirar a imagem de Gustavo da sua mente, daquele dia em diante,  as noite de Cláudia nunca mais foram as mesmas. Todo dia, cuidadosamente, seguia um ritual: Abria o seu velho diário e lia algumas páginas, buscando de alguma forma, lembrar o que havia ocorrido entre ela e Gustavo:

- Ah meu Deus, mas uma noite de sono perdida. O que está acontecendo comigo? Não tenho mais idade pra isso. Gustavo e tudo o que aconteceu naquela época - seja o que for - é passado, e no passado deve ficar.

Entretanto, mesmo tentando dominar sua vontade, uma força à impedia, não conseguira esquecer Gustavo.

Mas dez anos se passaram, e aquela velha senhora, com um cabelo um tanto quanto desgastado, já havia mudado mas uma vez de aparência. Cláudia agora estava realmente velha, sentia o peso de sua idade. Com os cabelos totalmente brancos, nem sequer conseguia pentear-se sem ajuda de alguém. Apesar de ser muito orgulhosa e ter gênio forte - por ser uma mulher sozinha -, Cláudia não viu outra opção; ir para um asilo. Não podia mais trabalhar (aliás, nem mesmo aguentaria). O tempo que tudo corrói e destrói, havia transformado aquela linda adolescente em uma velha amargurada cheia de arrependimentos.


A enfermeira entra no quarto de Cláudia:

- Olá, Dona Cláudia! Bom dia para a senhora? Como foi a noite?
- Como todas as outras.
- *Tentando entusiasmá-la* Bom, vou abrir essas persianas, deixar o sol entrar...
- Não.
- Mas Dona Cláudia...
- *Alterando o tom de voz* Eu NÃO quero!
- Olha Dona Cláudia, eu sei que a senhora não quer, mas aqui no "Lar pôr do sol", nos temos regras. E a senhora, querendo ou...
- *Sendo bruscamente interrompida* NÃO! EU NÃO QUERO! Será que não fui clara!? Eu pago uma fortuna nessa porcaria e nem ao menos posso ter um minuto de sossego?! Eu trabalhei minha vida toda e olha o que me aconteceu? Estou aqui sozinha! Jogada as traças! Porque meu Deus, PORQUE?

Depois desse desabafo, o silêncio se instalou por completo naquele ambiente. Apesar de regras, a enfermeira entendeu a dor e a angústia daquela mulher. Todos os dias ela fazia questão de levar as refeições para Cláudia, ficava alguns minutos, e saia. Não tentava mais abrir as persianas ou anima-la, aquilo tudo era inútil.

Com o passar do tempo, e sem ter outra companhia (por que qualquer pessoa que entrasse no seu quarto era rejeitada), Cláudia fez amizade com sua enfermeira, Zuleide. Zuleide era uma mulher muito trabalhadora, tinha dois filhos de um homem que havia se separado há três anos, trabalhava dia e noite para garantir o sustento dela e de seus meninos, vivia em função disso, em função deles. Mesmo assim, sempre foi uma mulher alegre, vivia com pouco, mas era feliz, agradecia a Deus por ter o pão pra pôr na mesa todos os dias.

Cláudia foi se aproximando cada vez mais de Zuleide. Certo dia, intrigado do porquê de tanta amargura, Zuleide resolver lhe perguntar:

- Porque a senhora é tão triste e solitária?
- Ah minha filha. Nunca me casei, nunca tive filhos, e diferente de você, nunca tive amigos. Meu melhor amigo sempre foi o meu dinheiro, mas nem ele me dá mais alegria.
- A senhora nunca se apaixonou?
- Sente-se, minha filha, é uma longa história.

Cláudia resolveu-lhe contar toda sua vida, explicou que não lembrava da briga que havia tido com Gustavo, porém, à alguns anos, uma misto de paixão e curiosidade fulminante não há deixava em paz.

Com lágrimas nos olhos, Zuleide prometeu ajudá-la, e disse que iria em busca de Gustavo.

Ela pegou todos os diários de Cláudia e passou a lê-los, um por um, todos os dias. Estava em busca de alguma informação sobre "Guga". Informação essa que  a própria Cláudia havia ido buscar, mais já tinha desistido, devido a problemas de visão, decorrentes de sua idade.

Passaram-se semanas, e nada. Zuleide não desanimava, mas Cláudia não tinha tempo à perder. Um câncer à pegou em cheio, e já não lhe restava muita esperança. Mesmo com dinheiro de sobra, o seu tratamento seria doloroso e longo, algo que não valeria à pena para as condições e a idade de Cláudia.

Quando menos podia se esperar, numa bela tarde de um sábado ensolarado, Zuleide encontrou algo. Encontrou um endereço, muito antigo de onde Gustavo morava - e quem sabe ainda não morasse? -,  e mais, descobriu o motivo da briga entre o ex-casal apaixonado. Antes de mais nada, não queria iludir àquela pobre senhora. Zuleide resolveu então ir em busca de Guga, se a sorte lhe sorrisse, só aí então, contaria a boa notícia a sua querida amiga Cláudia.

Rua Alameda Verde, nº 324. Numa rua antiga, Zuleide encontrou a casa. Uma casa velha, diga-se de passagem, mas reformada e aparentemente bastante aconchegante. Zuleide não podia conter-se de tanta alegria, correu, tocou a campainha, e esperou alguém atendê-la. Um menino de aproximadamente oito anos, abriu a porta:

- Oi Dona. Quer falar com a minha mãe?
- Ah, claro! Pode ser, eu agradeço.
- Certo, espera um minuto.

O garoto correu e avisou a sua mãe.

- Oi Moça. Tudo bom. Você quer falar comigo?
- Tudo. Bom, na verdade eu vim atrás de Gustavo Santos, à senhora não tem notícias dele?
- Gustavo!? (falou espantada).

Olhando para os trajes da enfermeira, disse:

- Ah meu Deus! Papai fugiu do asilo novamente? Eu não posso acreditar, eu pago uma fortuna com todo o sacrifício do mundo e ele faz isso!
- Não, Dona! Quer dizer, em qual asilo seu pai está?
- Ora, no "Lar pôr do sol"! A senhora por acaso não trabalha lá?
- *Espantadíssima e sem saber o que dizer* Claro! Claro!

Zuleide saiu correndo, mal podia esperar para encontra-lo, para dar a notícia a Cláudia. Ela estava em êxtase.

Ao chegar no Asilo, Zuleide pediu ajuda a uma amiga que sabia de informática, e no computador da recepção, conseguiram obter as informações. Gustavo estava no asilo a pouco mais de três meses, encontrava-se no 3º andar. Zuleide correu, chegando em seu quarto, deparou-se com um homem velho, cansando com o tempo, lendo um livro. Já era tarde da noite, mesmo assim, achou melhor contá-lo. Sem conter o ânimo, lhe deu um forte abraço, e disse:

- Meu Deus! O senhor não sabe o quanto o procurei!

Gustavo sempre engraçado, retrucou:

- Ora moça bonita, e só agora veio me achar?

Zuleide deu um belo sorriso e começou a contar-lhe toda a história.

Ao termino, Gustavo não conteu suas lágrimas e disse que precisava ir agora ver sua amada. Por já ser tarde, Zuleide ficou apreensiva, mesmo assim, o acompanhou. Ao chegar no quarto de cláudia, ela estava sentada, vendo Tv como de costume. Gustavo não podia conter a alegria, e esbravejou:

- Finalmente!

Vendo aquela cena, daquele homem sorrindo e Zuleide chorando emocionada, Cláudia não tinha dúvidas, era o seu Gustavo. Os dois abraçaram-se como nunca, choraram e beijaram-se. Um beijo tão singelo como o de duas almas que se completam.

Zuleide não poderia esquecer, mesmo não querendo interromper, falou:

- Cláudia! Eu sei o motivo da briga! Posso lhe contar!

Cláudia visivelmente emocionada, falou:

- Não Zuleide. Eu vivi todos esses anos da minha vida remoendo essa história. Essa história imaginária. Perdi anos, e nunca mais irei recuperá-los. Jamais poderei lhe agradecer pelo que fez por mim, mas por favor, enterre este segredo.

Entendendo sua vontade, Zuleide o fez, prometeu guardar eternamente o motivo de todo esse desencontro. Deixou os dois sozinhos e foi dormir.

No dia seguinte, o sol estava radiante como nunca. Há tempos não se via um domingo tão bonito. Como de costume Zuleide levantou-se, deu um beijo nas crianças e foi para o asilo, ao chegar lá, subiu no quarto de cláudia, mas não há encontrou. O quarto estava aberto, os raios de sol entravam por todos os cantos, haviam trocado os lençois e limpado tudo. Desesperada, e pensando no pior, Zuleide desceu e pediu informações a sua amiga que permanecia no turno da noite:

-  Angélica! Pelo amor de Deus! Onde a Cláudia está?!
- Zuleide, você tem que ser forte. A Dona Cláudia faleceu esta manhã.

Chorando muito, Zuleide voltou ao quarto de Cláudia e lá encontrou um envelope, com um bilhete que tinha algo escrito:

- Zuleide, você esteve presente quando eu mais precisei, foi a única pessoa que me estendeu a mão e realmente gostava de mim. Você me proporcionou o dia mais feliz de toda a minha vida. Em breve irei partir, e quero lhe dar um presente. Cuide deste pente, ele é extremamente valioso. Sei que nunca será o bastante, mais é tudo o que tenho.

Dentro do envelope havia também um testamento, onde Cláudia deixava todo o seu patrimônio para Zuleide. Desde aquele dia, Zuleide cuida de Gustavo e visita o túmulo de sua amiga. À qual jamais, esquecerá.


Obs: Dedicado a minha querida amiga Debora Lana, que me incentivou a dar continuidade a essa história. Espero que goste.

3 comentários:

  1. Muito linda essa história, gostei de verdade!
    Há coisas que ainda precisam ser reveladas... aguardo novas postagens.

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    1. Ah, valeu! Não, não. Nada de escrever mais histórias. Da muito trabalho. :D

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  2. Adorei, fiquei muito emocionada.
    Essa história é muito linda :)
    Mais quero saber qual é o motivo da briga.
    Bjo

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